outra narrativa cai e deixo
suspenso o olhar que sobre ela
espera
faz barulho
sente medo
se pisca por palavras se atropela
vai e volta de uma distância à outra
fonemas
sim
percebe
mas além
de letras se escuta outra pessoa
mirando em meu olhar que cai também.
Carlos Nascimento
BERNA
segunda-feira, agosto 01, 2016
sexta-feira, abril 22, 2016
terça-feira, abril 19, 2016
Terceiras Histórias - Namoa
Terceiras Histórias é primeiro álbum da Namoa: parceria formana por Camillo José, Julie Maria, Jonatas Onofre e algumas outras vozes, mãos e lentes como as de Thyago Grilo, Isabela Romeiro Vannucchi e Ricardo Pereira...
segue o link para audição e download* :
https://namoa.bandcamp.com/album/terceiras-hist-rias
*Para fazer o Download é só clicar em "buy now" e digitar 0 na lacuna de preço.
domingo, abril 17, 2016
segunda-feira, fevereiro 15, 2016
caligrafia
para britto
De galhofa no poleiro, os anjos.
Sim: esses putos. Deixa eles lá. Vamos,
corta a singularíssima cebola.
Camada por camada. Escrutina.
Isso, assim. Chama a coisa pela coisa.
Inflama a pena e o que restou de Ícaro.
Antes o rapto que o sexo dos anjos.
Como se diz... “por determinação”.
(Ah, e uma paciência de Jó, claro!)
Culpa de Murphy: onde tem torrada,
vai ter manteiga virada pro chão.
Metafísica alguma nisso. Nada.
Você lembrou bem. Vão lembrar do esforço.
Das palavras mais suadas. E só.
Guilherme Delgado
para britto
De galhofa no poleiro, os anjos.
Sim: esses putos. Deixa eles lá. Vamos,
corta a singularíssima cebola.
Camada por camada. Escrutina.
Isso, assim. Chama a coisa pela coisa.
Inflama a pena e o que restou de Ícaro.
Antes o rapto que o sexo dos anjos.
Como se diz... “por determinação”.
(Ah, e uma paciência de Jó, claro!)
Culpa de Murphy: onde tem torrada,
vai ter manteiga virada pro chão.
Metafísica alguma nisso. Nada.
Você lembrou bem. Vão lembrar do esforço.
Das palavras mais suadas. E só.
Guilherme Delgado
segunda-feira, fevereiro 01, 2016
Almare, Almare
Este, que aqui aportou,
Foi por não ser existindo.
Fernando Pessoa
I
Vinte anos.
Permaneceu mudo. Ela repetiu,
como ele já esperava, mas agora deixando transparecer alguma fúria.
Vinte anos,
Ulisses.
Era uma
guerra.
E depois?
Era uma
viagem.
Era nada.
Tudo são histórias.
A portaria do edifício Almare estava deserta
quando finalmente decidiu entrar. Certificou-se de que o cheiro de álcool
estava devidamente camuflado pelo perfume vagabundo, mas muito forte, que
costumava usar. O que procurava só podia estar no número 9 atrás de uma porta
de vidro, logo depois de um corredor, numa sala com papel de parede amarelo e
flores falsas.
E esse mormaço? Até chegar o inverno vai ser
assim.
Fingiu que ouvia o ascensorista dizer isto.
Concordou. Ele certamente falava outra coisa. Foi assim com o cego no boteco.
Enquanto a cachaça o abraçava por dentro fazendo todo calor de fora do corpo,
do recinto, da rua, parecer um alívio. Há muito tempo que ele só sabia fugir,
mas agora está voltando. Por isso não importava o que o outro bêbado, com
aqueles olhos vazados, tinha para contar. Eram desconhecidos e por mais irmãos
que a bebida os fizesse ali, nunca deixariam de estranhar-se.
É aqui senhor, Nono andar.
É aqui senhor, Nono andar.
Ei! Nono andar!
Ah desculpe, desculpe.
Ao sair do elevador tropeçou em algo
invisível que depois quase se materializou mais na frente. Então alcançou a
porta de vidro, mas de um vidro fosco, na verdade mesmo que fosse transparente,
por causa da péssima iluminação do local, não seria possível ver muita coisa do
outro lado. Importava? Ele sabia muito bem o que estava prestes a encontrar lá
dentro. Entrou. Um estampido e de repente o peito ardeu. Antes que sua vista começasse
a escurecer, deixou que o clarão e o susto fossem perdendo força. No outro
extremo da sala, quase no ponto em que se formava um triângulo entre duas
paredes, com o rosto brevemente encoberto pela penumbra, sentada, xale nos
ombros, óculos ocultando os olhos, ela o esperava.
Vinte anos.
Permaneceu
mudo. Ela repetiu, como ele já esperava, mas agora deixando transparecer alguma
fúria.
Vinte anos, Ulisses.
Era uma guerra.
E depois?
Era uma viagem.
Era nada. Tudo são histórias.
II
O corpo de um homem foi encontrado com um tiro
no peito hoje pela manhã numa das salas do nono andar do edifício Almare, na
Avenida Guararapes. A vítima ainda não foi identificada, mas o mistério mais
intrigante ainda é quem cometeu o crime já que, segundo os porteiros e
ascensoristas, ninguém foi visto entrando ou saindo do local. A hipótese de
suicídio não foi descartada.
III
Quando Ulisses desembarcou no porto do Recife
deixou sua carteira cair no meio das ondas para nunca mais ser encontrada.
IV
Sentada no escuro daquela sala, tão longe do homem
que a abandonou, ela pode tremer, fumar em paz e esperar. Sabe que ele está
cada vez mais perto. Lembra-se do telefonema do dia anterior. Ele marcando o
encontro ali. Onde tudo terminou e agora estava prestes a terminar de novo e
para sempre. Sobre as coxas a arma às vezes balança. A vingança tem quase a
mesma maciez e mentira do xale que ela usa a contragosto. Os cigarros bem que
podiam ser infindos como as horas que antecedem um instante trágico. Ela testa
a mão esquerda, depois a outra. Experimenta o peso, como se não tivesse passado
as últimas décadas treinando para esse momento. O que lhe causa mais angústia e
só agora ela se dá conta é que nunca pensou no que diria antes. Nunca
considerou que o antes de tornar-se uma assassina exigia um grande diálogo. Por
isso quando ele abre a porta os dois apenas se permitem um grito, uníssono,
misto de espanto, saudade surpreendida e alívio. E a arma dispara.
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